Entrevista a Alberto João Jardim no Expresso


Alberto João Jardim: “Passos Coelho prejudicou o PSD e prejudicou o país”


Dois anos depois de ter deixado o Governo da Madeira, e da sua reforma política, a língua e a pena de Alberto João Jardim continuam afiadas. Ao lançar uma biografia política com as memórias destes últimos 40 anos, o antigo homem forte do PSD Madeira é entrevistado por Reinaldo Serrano, numa conversa que pode ler este sábado no Expresso ou ver na SIC. Aqui ficam algumas das principais tiradas dessa conversa

REINALDO SERRANO (TEXTO), GREGÓRIO CUNHA (FOTOS)
Semanário Expresso 14-04-2017


SOBRE CAVACO SILVA

“Na altura da construção do aeroporto da Madeira, se o professor Cavaco não tivesse o empenho que teve eu não teria tido 50% dos custos do aeroporto pagos pela UE. E devia-lhe isso. E foi quem mais me ajudou no fim, como Presidente da República. Por exemplo, quando quiseram rebentar com a Zona Franca da Madeira, que não é um offshore, foi o professor Cavaco Silva que interveio e fez com que Bruxelas recuasse.”

DÍVIDA DA MADEIRA

“A Madeira era a região mais atrasada do país no 25 de Abril e, com o sistema autonómico, as receitas mal davam para as despesas correntes. Portanto, a única maneira de a Madeira ascender à qualidade de vida dos europeus era recorrendo à dívida pública. Seria um crime eu desperdiçar os fundos que vinham da Europa só porque não recorria ao endividamento. Hoje, fazia exatamente a mesma coisa, até porque continuo a dizer que a dívida é uma dívida histórica e está na altura de fazermos contas.”

MARCELO REBELO DE SOUSA

“Eu fui vice-presidente do Marcelo no PSD e tenho uma grande amizade por ele, mas não quero por enquanto pronunciar-me sobre o mandato dele.”

JOSÉ SÓCRATES

“Sabe, eu tive muitas dificuldades de relacionamento com o engenheiro Sócrates no início, mas no final já nos dávamos bem.”

GREGÓRIO CUNHA

PASSOS COELHO

“Talvez o primeiro-ministro com que eu me tenha dado pior foi o penúltimo, porque já vinham questões de trás de dentro do partido. Há um dos capítulos do livro em que eu conto todos os desaguisados com ele, que podem ter sido ajudados por incompatibilidades de feitio. Dei 46 ou 47 vitórias ao partido e no congresso em que saio nem boa tarde, nem passe muito bem? Por amor de Deus…
No livro procurei dar o maior cunho pessoal possível, não ia vestir smoking para o escrever. Perdoar perdoa-se sempre, mas não se deve é esquecer. Passos Coelho prejudicou o país e a região.”

PSD

“O grande drama é que o centro político desapareceu. O PSD chegou-se com Pedro Passos Coelho à direita. O PSD andava ao centro. A classe média esbateu-se e o centro com ela. É preciso haver um centro político para ajudar a ter uma classe média forte.”

PODER DAS JOTAS

“Hoje há uma geração que não se revê nas ‘jotas’. As ‘jotas’ tiveram um grande papel decisivo na defesa da democracia e na afirmação da democracia nas universidades, na altura em que a democracia, também depois do 25 de Abril, correu perigo. Mas a pouco e pouco, com a vinda dessas ‘jotas’ aos grandes lugares de responsabilidades do país, apareceu uma outra, a ‘jota’ que já estava a pensar que a sua instalação no partido também faria parte do seu futuro de vida. Isto levou à degradação dos partidos. Como é que se decide hoje a direção de um partido? Inscreve-se lá uns tipos, quem tem dinheiro arranja lá uns tipos inscritos e não se tiram. Você acha que se alguém agora quisesse pôr o Passos na rua ou aqui a direção do PSD da Madeira fora, conseguia? Não.”

ESQUERDA

“Isto a que hoje chama esquerda é uma coisa colada com cuspe, eles estão unidos porque é preciso que a direita não esteja no poder, é o programa dos três partidos. Não há uma reforma do país… Isto é uma questão de tempo para a gente se espalhar outra vez.”

ANTÓNIO COSTA

“Ele é um homem tolerante, sabe? É um homem com habilidade política neste sentido, não é dogmático nem casmurro, ele tem uma grande versatilidade. A única dúvida que eu tenho sobre o António Costa é quando as coisas se complicarem mais e for preciso dar murros na mesa. Repare, aquilo é um acordo, não é uma coligação, é um acordo com dois partidos totalitários. Ora, vai chegar um momento, é a lógica das coisas, que não vai ser mais possível o entendimento. O que é que ele fará então? É um pouco como o Marcelo: ainda não chegaram os momentos em que eles têm de demonstrar o que valem.”

GREGÓRIO CUNHA

GERINGONÇA

“Eu fiquei surpreendido. Depois de tudo o que se passou, como é que aquela coligação ainda teve tantos votos depois do que eu considero um desastre de governação? E tinha também a impressão de que se eles não tivessem a maioria absoluta, ia suceder qualquer coisa. Não me vou armar em adivinho e dizer que era esta solução, mas eu não acreditava que a esquerda portuguesa os deixasse ficar lá. Na noite das eleições, quando eu vi o secretário-geral do partido comunista mais aquela moça muito simpática que é do Bloco de Esquerda dizerem umas coisas, eu disse ‘se o Costa quiser é primeiro-ministro’, foi esse o meu murmúrio lá em casa.”

FERNANDO MEDINA

“Não quero entrar nas autárquicas, mas o Dr. Medina, atual candidato socialista à Câmara de Lisboa, eu estou sempre a brincar com ele e digo-lhe ‘vai ser um dia o primeiro-ministro de Portugal’. E ainda quando ele me telefonou, a despedir-se quando eu saí do governo, eu disse-lhe: ‘Não se esqueça do que eu lhe ando a dizer, vai ser um dia primeiro-ministro de Portugal’. O Medina foi o representante do Governo da República, que, com o meu vice-presidente que representava o governo regional, tiveram a cargo a recuperação da Madeira e nós na altura trocámos a lei das finanças regional por uma lei de meios. E o Medina foi impecável a trabalhar connosco. Fiquei-lhe muito grato pelo trabalho que ele fez aqui na Madeira.”

GUTERRES

“Dou-me bem com ele, sabe porquê? Ele foi o primeiro primeiro-ministro que cumpriu o estatuto político da Madeira e dos Açores. Não se tinha chegado a acordo com governos anteriores, inclusive o governo do professor Cavaco. Eu devo ao engenheiro Guterres e ao professor Sousa Franco termos chegado a acordo.”

FUTURO POLÍTICO

“Nem pensar: estava-lhe a dizer que, quando a gente sai da política e de repente volta, acaba sempre por borrar o que estava para trás.”

CANDIDATURA PRESIDENCIAL

“É louco! Eu, aos 74 anos, vou para uma candidatura presidencial? Estamos aqui a brincar aos cowboys ou quê?”

SAÍDA DA POLÍTICA

“O clique foi, em primeiro lugar, o enfarte. Em segundo lugar, eu concorri ainda em 2011 contra a direção nacional do meu partido, porque iam ser os quatro anos de aplicação do plano de ajustamento económico e financeiro, e não queria que se dissesse que eu governei enquanto havia dinheiro e nos tempos fáceis. Quis demonstrar que sabia governar em tempos muito difíceis.”

Link para a entrevista.