João Welsh: Subsídio de Mobilidade


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Observatório da Comunicação Social
Artigo de Opinião de João Welsh
Terça-feira, 7 de Agosto de 2018 00:25 "O Observador"
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Comentário CM: a verdade e as consequências, desde o erro da concepção inicial até à alteração aprovada na Assembleia da República por proposta da Assembleia Regional. Parece ofensivo perguntar a quem sabe para produzir melhor e a bem de todos.

Madeira – Subsídio de mobilidade, enganos /premium

  • João Welsh
A alteração do subsídio de mobilidade, aprovada pela AR, é de uma irracionalidade e irresponsabilidade inqualificáveis, por muito que na aparência e na bondade possa parecer a solução milagrosa

A alteração do subsídio de mobilidade, agora aprovada na generalidade pela Assembleia da República com base numa proposta estapafúrdia do parlamento madeirense, visando o pagamento direto às companhias aéreas em substituição do pagamento aos passageiros residentes, é de uma irracionalidade e irresponsabilidade inqualificáveis, por muito que na aparência e na bondade possa parecer a solução milagrosa.

Vai prejudicar os residentes, sendo um tiro de caçadeira, nos pés, para o turismo da Madeira. Um brutal erro de casting populista.

Convém relembrar que, em 2006, o Governo Regional da Madeira reuniu um grupo de trabalho para estudar o transporte aéreo para a região; a hipótese de liberalização da rota continente/Madeira e o modelo de subsídio de mobilidade.

Na época, o problema, alvo de todas as críticas, era o condicionalismo ao monopólio da companhia pública, a TAP, deixando os residentes e os turistas sem alternativas e a Madeira sem possibilidades de crescimento.

O Grupo de Trabalho, sustentado em credíveis estudos e pareceres, concluiu que a rota já tinha atingido a massa crítica necessária para podermos avançar com uma liberalização saudável e frutuosa para a Região.

Para que isso acontecesse, era condição elementar acabar com a responsabilidade, por parte das companhias aéreas, pelo adiantamento do subsídio e validação da sua elegibilidade, transferindo-o para os passageiros residentes, por forma a evitar barreiras concorrenciais e constrangimentos bloqueadores de uma operação aberta e dinâmica.

O monopólio acabou, a liberalização aconteceu, passamos a ter 4 companhias a operar rotas nacionais (TAP e Easyjet, rota de Lisboa e Porto; Transavia, rota do Porto e SATA, rota de Ponta Delgada), e a linha continua aberta a novos operadores que queiram entrar. O número de ligações cresceu significativamente, o número de turistas entrados em trânsito via Lisboa, Porto e mesmo dos Açores disparou para números nunca antes vistos e o número de passageiros residentes cresceu mais de 80% nos últimos 10 anos.

Ou seja, a liberalização, apesar de todas as críticas, resultou em cheio e tem sido fundamental para o crescimento do turismo regional e de mais oferta aos madeirenses.

Demagogias à parte, o Governo Regional, o PSD Madeira, a oposição regional e os deputados da Nação, não podem esquecer o passado recente, e o que foi possível alcançar com a liberalização da rota do continente para a RAM, correndo o risco, se o Alzheimer político não for tratado a tempo, de cometerem asneiras grosseiras que levarão a região de volta a um passado monopolista.

Reverter o ónus do adiantamento do subsídio e da prova da condição de residente do Estado para as companhias, tornando-as responsáveis pela validação da qualidade do passageiro residente e financiadoras do sistema (independentemente dos eventuais mecanismos financeiros de reembolso geradores de burocracias acrescidas, não remediadores da responsabilidade e custos do controlo da elegibilidade e das centenas de milhares de euros de bilhetes não reembolsados decorrentes da interpretação de validação), provocará distorções concorrenciais e fará disparar as tarifas, prejudicando o turismo e os gastos públicos com o sistema. Poderá afastar os operadores atuais e irá retirar atratividade à entrada de novas companhias.

Os problemas atuais resultam não do facto do subsídio ser pago ao passageiro residente, mas sim de um modelo mal desenhado pelo Governo Regional (não pelo governo da República, este responsável pela absoluta falta de sentido de Estado no adiar das negociações das alterações, ao tempo oportuno das suas estratégias eleitoralistas para a região) nos seus mecanismos de controlo despropositados como são as tarifas não elegíveis, os 60 dias de reembolso e as burocracias físicas para o reembolso sem opção online, entre outros.

Quanto aos preços altos que atualmente se verificam na rota, por muito que se queira entrar em raciocínios desprovidos de raciocínio, no facilitismo de análise, na demagogia, na ânsia teatral da simpatia populista, na identificação das consequências e não nas causas das causas, a realidade é que nada têm a ver com o modelo de subsídio de mobilidade em vigor, nem com a boa ou má vontade das companhias aéreas (a não ser que se defenda preços por decreto marxista, inibidores de um mercado livre e saudável).

Os preços estão atualmente altos porque:

  • a crise no norte de África e Médio Oriente gerou um aumento significativo de fluxos turísticos para a região;
  • a liberalização e os dois últimos modelos de subsídio de mobilidade (com todas as suas imperfeições) fomentaram um aumento brutal de turistas e residentes (estes representam cerca de 30% do tráfego das rotas nacionais) a viajar;
  • os residentes, racional e legitimamente, na gestão das suas agendas frenéticas do século XXI marcam cada vez mais as suas viagens em cima da hora;
  • os constrangimentos no aeroporto de Lisboa e a ausência de slotsbloqueiam a entrada de novas companhias na rota e mais rotações por parte das existentes;
Sintetizando, a procura disparou como um foguetão e a oferta de lugares congelou. Resultado: os preços subiram.

Culpadas as companhias? Não, porque existem para ganhar dinheiro e só desta forma é que podem servir bem, pagarem salários, serem saudáveis e não viverem à conta dos nossos impostos. É desagradável o que acabo de referir. Admito, mas mais desagradável é a mentira, a ilusão, as falsas promessas, o roubo aos nossos impostos para soluções de companhias públicas falidas ao serviço não dos passageiros mas das greves sindicalistas, das lógicas eleitoralistas e dos “jobs for the boys”.

Quanto à opção de uma companhia regional, aventada por alguns, sejamos realistas, não há capital na RAM para um projeto dessa natureza a não ser que se pretenda, à imagem populista do Ferry Funchal/Portimão, um custo público de dois mil euros ou mais por passagem e as rotas a serem decididas no parlamento regional ao sabor das propostas mais exóticas e desprovidos de racionalidade económica, sempre formuladas no princípio da demagogia da competitividade partidária.

No que diz respeito às propostas, também sugeridas a nível regional, da nacionalização da TAP, a reversão total, essa proposta fará sentido se a autonomia regional optar por se inspirar na Venezuela de Maduro. Mas a RAM não se pode esquecer o que custou no passado em mau serviço subsidiado pelos nossos impostos.

O problema dos madeirenses não se resolve no engano populista do confronto disfuncional diário com as companhias que ainda servem a RAM, mas sim num processo negocial construtivo com estas; através de um modelo de subsídio de mobilidade que não esteja armadilhado em excessos de limitações e burocracias e num lobby político de pressão para resolução dos problemas infraestruturais do aeroporto de Lisboa e da construção do aeroporto Lisboa 2.

Eu sei que a TAP tem tido, ultimamente, falhas graves para a Madeira e outros destinos. Vivo-as na pele, mas isso não é contra o destino Madeira ou outro qualquer, mas fruto de erros de gestão, num deficiente planeamento estratégico de crescimento, demasiado ambicioso para os meios e recursos disponíveis da companhia. Como tem gestão e interesses privados – direitos económicos de 90% — não duvido que tudo estejam a fazer para estancar os prejuízos que estas inconsistências geram.

Em suma, temos de tratar do que realmente interessa e não na base de objetivos eleitoralistas inconsequentes que não servem os residentes, o turismo, a região e o País.

Empresário