Jarbas, Freitas & Companhia



Eram 20H30, naquela noite chuvosa de sexta-feira de 1988, o presidente do Sindicato dos Estivadores Marítimos do Arquipélago da Madeira e o do Sindicato Livre dos Carregadores e Descarregadores dos Portos da Região Autónoma da Madeira estavam reunidos no nº 73 da Rua de Santa Maria.

Em cima da mesa, estava o maior desafio de sempre dos poderosíssimos sindicatos dos Portos da Madeira. O plano secreto dos dois Sindicatos era adquirir um navio cargueiro, e tornarem-se Armadores e Transitários. O projeto, tinha tanto de genial, como de assustador, pois os Portos da Madeira corriam o risco de ficarem sob o  poder monopolista dos dois sindicatos tornando-os ainda mais poderosos.

Enquanto, a meio dos copos, discutiam os pormenores do projeto, não faziam a mínima ideia que ali dentro havia um bufo. O bufo viu ali a oportunidade da sua vida, e sem muitas demoras, e pela surdina, contactou o Governo Regional, que ficou simplesmente atónito com as notícias. Era preciso fazer qualquer coisa. Os Armadores e Transitários amigos do regime corriam sérios riscos de falência, se o plano da compra de um navio pelos Sindicatos fosse para a frente.

E foi então que, em pânico, o governo de então, em conluio com um armador do regime elaborou um plano encapuçado de reestruturação dos Portos da Madeira. O plano era simplesmente maquiavélico e incluía comprar os presidentes dos Sindicatos e afastar os restantes trabalhadores reticentes da Ribeira Seca de Machico protegidos pelo então comunista Padre Martins.

E foi assim, que através de um plano ardiloso, o armador recorreu à Banca, e com a complacência e proteção do Governo, negociou chorudas e irrecusáveis reformas com os trabalhadores problemáticos. Para o efeito, e com a cumplicidade da Segurança Social, foram enviados para uma reforma irrecusável todos aqueles que podiam criar problemas.

O bufo era esperto, e em meia dúzia de dias, conseguiu convencer os dois presidentes dos sindicatos que o negócio do navio era muito arriscado (onde já ouvimos esta história?) e que tinha outra ideia melhor. E foi assim que o bufo, o Governo Regional e o armador, já com a complacência dos sindicatos, criaram uma estratégia para a gestão dos Portos que incluía uma empresa de gestão de recursos humanos partilhada pelos três. Como prémio pela ideia, o bufo, de simples e reles escriturário do sindicato, passou a gestor de confiança do Armador e dos Sindicatos.

E de repente, e quase sem ninguém se aperceber, os presidentes dos sindicatos de então, e a família do bufo criaram diversas empresas que  prestavam serviços à tal empresa que geria o trabalho nos Portos da Madeira. Isto é, ganhavam como sindicalistas e como empresários. O dinheiro do negócio  dava para todos, e para a história, ficou celebre a frase do então presidente do Sindicato dos Carregadores que "o Gamelão chegava para todos", isto é, para bom entendedor meia palavra basta, ou seja, o chiqueiro era o mesmo, embora os porcos fossem outros.

E para quem ainda não se apercebeu, 30 anos depois,  a história arriscada do navio voltou a repetir-se com o Ferry, e que,  por coincidência ou não, o tal bufo  chamava-se  Pedra.

“A primeira e pior de todas as fraudes é enganar-se a si mesmo. Depois disto, todo o pecado é fácil.”

 J. Bailey