Talvez fosse de se familiarizar com alguns conceitos que de repente poderão ser o pão nosso de cada dia, ao estilo ketchup, ao fim de décadas. Dizem que se andam a mexer ... a impunidade não significa que se safou, o acto existiu, só não foi avaliado.
O que é a corrupção?
De um modo geral, a corrupção pode-se definir como o desvio de um poder para fins diferentes daqueles para que foi concedido. Ou seja, o uso (abuso) para fins particulares de um poder recebido por delegação.
Esta definição cobre uma ampla gama de práticas: os conflitos de interesse, o desvio de fundos públicos, somas extorquidas por funcionários públicos abusando do seu poder, as autoridades públicas subornadas por pessoas ou empresas para fechar os olhos ao incumprimento de certa regulamentação ou para tomar uma decisão não imparcial, ofertas ou subornos de uma empresa dirigidos ao responsável pelas compras de outra empresa, etc.
A corrupção normalmente envolve duas ou mais pessoas que entram em um acordo secreto.
O acordo pode ser, por exemplo, para pagar um incentivo financeiro a um funcionário público para garantir em troca alguma atitude a seu favor.
Em casos de corrupção internacional ou no estrangeiro, isso pode-se manifestar por uma empresa nacional a pagar um suborno em benefício de um funcionário público estrangeiro, a fim de ganhar um contrato. Isso pode ser feito através de uma terceira pessoa intermediária no acordo, um agente ou consultor, ou diretamente pela empresa nacional ao funcionário público.
Muitas vezes são usados, pelas pessoas envolvidas, métodos engenhosos de fazer os pagamentos, inclusive a transferência do dinheiro através de várias empresas offshore (que aparentemente não têm nada a ver com o destinatário) registadas em diferentes países.
A corrupção é uma ameaça à estabilidade e segurança das sociedades, na medida em que mina as instituições e os valores da democracia, os valores éticos e a justiça e na medida em que compromete o desenvolvimento sustentável e o Estado de direito.
Nos casos graves existem ligações entre a corrupção e outras formas de criminalidade, em especial a criminalidade organizada e a criminalidade económica, incluindo o branqueamento de capitais.
Áreas da corrupção
A prática de atos de corrupção pode ocorrer em sectores de atividade diversos, quer de natureza pública quer de natureza privada.
Atos de corrupção podem, assim, ocorrer no âmbito:
- Da atividade de entidades ou serviços públicos;
- Da atividade de entidades do sector privado;
- Do comércio internacional;
- Da atividade desportiva.
Indicadores de corrupção
As características e a natureza dos atos de corrupção, designadamente o secretismo dos acordos entre os indivíduos envolvidos, tornam difícil a identificação e deteção de tais comportamentos.
No entanto, ainda que não esgotantes, podem ser identificadas algumas práticas, indiciadoras de eventual corrupção.
Poderão ser indicadores de corrupção práticas ou comportamentos com as seguintes características:
- Pagamentos não usuais, ou relativamente aos quais se exige urgência não justificada, ou feitos antes da data prevista
- Pagamentos feitos através de países ou entidades diversas das que forneceram os bens ou serviços
- Percentagens de comissão anormalmente altas
- Reuniões privadas com agentes públicos que tenham a seu cargo a negociação dos contratos ou com empresas interessadas nesses contratos
- Recebimento de presentes ou dádivas não justificadas
- Insistência do agente em ser ele a praticar todos os atos relativos a determinadas operações, ainda que o não possa fazer ou não lhe compita apenas a ele fazê-lo, ou insistência em ser ele próprio a contactar um especifico interessado na operação ou negócio
- Tomar decisões inesperadas ou não fundamentadas
- Assumpção pelo agente do tratamento de casos para os quais o agente não tem o necessário e exigido nível de conhecimento ou especialização
- Abuso das competências ou poderes para a decisão de determinados casos
- Aprovação de operações ou negócios que não são favoráveis ao organismo a que o agente pertence
- Inexplicável preferência por determinadas empresas ou agentes
- Não cumprimento de regras ou linhas de orientação dos organismos para determinadas operações
- Não documentação de reuniões ou de decisões relativas a determinadas operações
- Pagamento ou disponibilização de fundos para despesas de elevado valor em nome de terceiros
- Criação de impedimentos a determinados e específicos sectores funcionais ou serviços do organismo essenciais à concretização da operação ou negócio
Procedimento criminal
Denúncia anónima
Embora a comunicação dos factos possa ser feita de forma anónima, as denúncias anónimas encontram-se sujeitas a um regime legal específico e nem sempre substituem a denúncia formal dos factos, que deve ser efetuada num serviço do Ministério Público ou num órgão de polícia criminal.
Assim, de acordo com o Código de Processo Penal, a denúncia anónima só pode determinar a abertura de inquérito se:
- Dela se retirarem indícios da prática de crime, ou
- Constituir, ela própria, crime.
A denúncia anónima pode não determinar a instauração de inquérito. Há casos em que a validade da denúncia depende da sua apresentação pelo titular do direito de queixa, no prazo legalmente previsto, o que é pressuposto necessário para que o Ministério Público proceda criminalmente.
Nesses casos é necessário que o denunciante/queixoso se identifique e assine a queixa, ou que a apresente através de mandatário judicial ou mandatário munido de poderes especiais para o efeito.
Se tal não acontecer o Ministério Público não pode dar início ao procedimento criminal.
Denúncia Obrigatória
Importa também que tenha conhecimento de que, mesmo nos casos em que o agente do crime não seja conhecido, a denúncia é obrigatória para:
- As entidades policiais relativamente a todos os crimes de que tiverem conhecimento;
- Os funcionários, tal como considerados no art. 386º do Código Penal, relativamente aos crimes de que tiverem conhecimento no exercício das suas funções ou por causa delas.
Denúncia Facultativa
- Exceto nos casos em que o procedimento criminal depender de queixa ou de acusação particular, qualquer pessoa que tenha conhecimento de um crime pode denunciá-lo ao Ministério Público, a outra autoridade judiciária ou aos órgãos de polícia criminal.
Protecção de testemunhas
Verificados os respetivos pressupostos legais, poderão ser aplicadas as seguintes medidas de proteção de testemunhas:
- Ocultação da testemunha – através de ocultação de imagem ou com distorção de voz ou de ambas;
- Audição por Teleconferência
- Não revelação da identidade da testemunha
- Medidas pontuais de proteção, designadamente a indicação, no processo, de residência diversa da residência habitual; transporte em viatura oficial para intervir em ato processual; disponibilização de local vigiado e com segurança nas instalações judiciárias ou policiais a que tenha de se deslocar e no qual pode permanecer sem a companhia de outros intervenientes processuais; proteção policial, extensiva aos seus familiares ou a pessoa que com ele conviva em condições análogas às dos cônjuges ou outras pessoas que lhe sejam próximas; alteração do local físico da residência habitual.
- Programas especiais de segurança
- Concessão de moratória em caso de impossibilidade de cumprimento de obrigações pecuniárias para com o Estado ou outras entidades públicas, se a sua colaboração com a justiça tiver colocado a testemunha em situação patrimonial que a impossibilite de cumprir tais obrigações
Garantias dos denunciantes
Garantias dos denunciantes de factos de corrupção:
- A lei garante que os trabalhadores da administração pública e de empresas do sector empresarial do Estado que denunciem os factos de que tenham conhecimento no exercício das suas funções ou por causa delas, não podem ser prejudicados, sob qualquer forma, incluindo a transferência não voluntária.
- Aqueles trabalhadores têm direito ao anonimato, exceto para os investigadores, até à dedução da acusação.
- Após a dedução da acusação, têm direito a ser transferidos, sem possibilidade de lhes ser recusada a transferência pedida.
- A aplicação de sanção disciplinar àqueles trabalhadores até um ano após a denúncia presume-se abusiva.
Fonte: Ministério Público